quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Resultados já ou soluções de futuro?

Artigo de opinião publicado no diário ‘As Beiras’
em 22 de Janeiro de 2010


Nos dias de hoje tudo parece imediato. Nalguns casos, todos apreciamos a capacidade que existe hoje em fazer certas coisas bem e depressa, pois tal está por detrás de muito do desenvolvimento das civilizações. As tecnologias da informação e comunicação são, sem dúvida um dos potenciadores desta mudança revolucionária.

Quantas vezes, no entanto, os maravilhosos resultados imediatos comprometem a adopção de soluções de futuro? Infelizmente, na área do e-government – seja ele local ou não – vezes de mais se privilegia o impacto do imediato em detrimento da modernização consistente e planeada. Analisemos um pouco mais esta questão.

Muitas das iniciativas de modernização a que assistimos hoje estão assentes no pressuposto de que disponibilizando financiamento os resultados aparecem. A dura realidade mostra-nos que tal não é assim.

Primeiro, há que saber direccionar o financiamento para acções e actividades que tenham em vista a criação de condições infra-estruturais, isto é, para acções e actividades que criem a base sobre a qual se vai proceder à modernização. Há, também, que produzir linhas de orientação para o desenvolvimento dessas infra-estruturas – sejam elas físicas (por exemplo, redes, equipamentos, servidores), ou lógicas (por exemplo, sistemas de informação, ambientes aplicacionais) – sob pena de se aumentar a já demasiada elevada ‘entropia’. Tal compete, em grande medida, às entidades financiadoras.

Em seguida, há que apoiar a Administração Pública na definição de projectos concretos, globalmente consistentes e tecnologicamente niveladores, evitando-se assim um Estado a muitas velocidades, onde os que têm mais capacidade técnica e humana se modernizam e os restantes ficam cada vez mais para trás. Tal só conduz a desequilíbrios altamente prejudiciais para as regiões e, consequentemente, para as populações, sendo totalmente injustificado num País tão pequeno como o nosso. Infelizmente, a cultura da ‘competição’ – sempre apregoada como salutar – tem acentuado este efeito pernicioso, conduzindo a que o Estado compita com ele próprio e acentue as desigualdades no seu seio.

Para além disso, há que investir nos recursos humanos, sobretudo em termos de formação. Naturalmente, tem, ainda, que se proceder a um acompanhamento técnico – e não meramente formal ou administrativo – de todos os projectos, assegurando que produzem resultados adequados.

Em resumo, há que definir linhas de acção devidamente estruturadas e coordenadas, elaborar linhas de orientação, promover o nivelamento tecnológico e acompanhar, de um ponto de vista técnico, a execução dos projectos. Tem que se ultrapassar, de uma vez por todas, a cultura dos ‘resultados imediatos a qualquer preço’ e trabalhar para o desenvolvimento e modernização a médio e longo prazo. É isso que é feito nos países mais desenvolvidos, que definem planos e programas a dez ou quinze anos. Naturalmente que tal tem que ser feito envolvendo todos os parceiros relevantes, que incluem a administração central, a administração local e, não menos importante, as cidades e regiões digitais. Só assim se pode consolidar os resultados de hoje e trabalhar todos os dias para um melhor Amanhã.


Fernando P. L. Boavida Fernandes
Professor Catedrático da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra
Presidente do Conselho de Administração da Associação Coimbra Região Digital