terça-feira, 26 de abril de 2011

A revolução das TIC


Artigo de opinião publicado no diário ‘As Beiras’
em 25 de Abril de 2011


Passados trinta e sete anos, as tecnologias da informação e comunicação (TIC) permitem-nos relembrar com detalhe a história da Revolução dos Cravos, em todo o seu impacto e relevância, extensamente testemunhados no site do Centro de Documentação 25 de Abril da Universidade de Coimbra e em muitos outros sites na Internet.

Muito mudou no Mundo desde essa data. Ditaduras caíram. Países houve que desapareceram. Outros renasceram. Outros, ainda, formaram-se. Mas o que mais mudou foram as próprias tecnologias da informação e comunicação que, ao sofrerem uma revolução, revolucionaram elas próprias a vida de todas as sociedades do planeta, criando uma comunidade global.

As redes e serviços de comunicação sofreram uma mudança radical com a massificação dos computadores, da Internet e dos dispositivos móveis. Com elas mudaram também a comunicação social e todas as formas de interação e socialização. Pessoas de todo o Mundo comunicam entre si, independentemente da sua origem ou localização geográfica.

As TIC revolucionaram também a forma como se trabalha e, por conseguinte, as empresas e o emprego, os meios e formas de produção, os processos de engenharia. A produtividade aumentou fortemente. Os ciclos de desenvolvimento encurtaram. Novas áreas de negócio foram criadas.

Os avanços na ciência e na investigação foram e são fortemente impulsionados pelas TIC. Computadores cada vez mais poderosos são utilizados para alargar as fronteiras do conhecimento. Redes de comunicação de muito alto débito servem de suporte à supercomputação distribuída. A Internet possibilita a cooperação de muitos milhares de máquinas, que contribuem com a sua capacidade de processamento para a resolução de problemas complexos.

A medicina recorre intensivamente a soluções informáticas. Tomografias axiais computorizadas, ecografias, radiologia digital, análises clínicas, implantes cocleares, lasers cirúrgicos, e telemedicina são alguns exemplos bem conhecidos de exames, técnicas e ferramentas ligadas à saúde nas quais as TIC desempenham um papel essencial.

As TIC revolucionaram, ainda, áreas tão importantes – e, nalguns casos, tão díspares – como a arte, o lazer, a história, a política e a economia. Os mais famosos museus do Mundo utilizam as TIC para divulgação e promoção. A indústria dos jogos movimenta somas gigantescas à escala do planeta. Por outro lado, governos e estados recorrem cada vez mais às TIC para praticamente todas as suas atividades. Bolsas e mercados seriam hoje impensáveis sem as tecnologias da informação e comunicação. Muitos dos avanços em investigação e reconstituição históricas não teriam sido possíveis sem os computadores.

Por fim, as TIC revolucionaram, até, as revoluções, dando aos povos uma das armas mais poderosas do mundo: a comunicação sem barreiras. Se existissem então tal como hoje, certamente que as TIC teriam tornado ainda mais extraordinária a revolução Portuguesa de 25 de Abril de 1974.

terça-feira, 19 de abril de 2011

Ouro, prata e bronze


Artigo de opinião publicado no diário ‘As Beiras’
em 18 de Abril de 2011, com o título "Prata da casa"


Na última década temos podido observar uma significativa alteração do panorama tecnológico em Portugal, com especial ênfase na área das tecnologias da informação e comunicação (TIC). Inúmeras empresas de base tecnológica têm surgido, o que, para além de gerar emprego numa área onde há relativamente pouco tempo ele era quase inexistente, evita que se importem serviços e tecnologia e, para além disso, leva a que Portugal exporte para tudo o Mundo.

Também é interessante verificar que muitas dessas empresas são empresas de spin-off, com a sua génese no meio universitário, sendo isto um claro indicador de que não são só as empresas que estão a mudar mas, também, a própria Universidade, cada vez mais virada para as reais necessidades da nossa sociedade e cada vez mais atuante.

Apesar disso, a área das TIC é, ainda, uma das áreas tecnológicas onde mais se importa bens e serviços. Estado e empresas recorrem intensivamente a soluções de TIC desenvolvidas externamente, com elevados custos de aquisição e licenciamento. Se em certos casos tal é inevitável, em muitos outros o desenvolvimento e a integração de soluções nacionais seria perfeitamente possível.

O caso mais comum é o da baixa utilização de soluções de código aberto. Este tipo de soluções não é livre de custos, mas é claro que, em situação de crise e de desequilíbrio de balança comercial, é preferível aplicar o dinheiro que seria gasto em dispendiosos licenciamentos de software investindo nas pessoas necessárias para operacionalizar as soluções de código aberto. Assim, gastar-se-iam menos divisas, criar-se-ia emprego e incrementar-se-ia a autonomia tecnológica. Não seríamos o único país a fazê-lo, muito pelo contrário.

Não parece, infelizmente, ser essa a opção mais frequente. Porque será que no meio de tanta medida de modernização administrativa – de Estado e de empresas – não se descortina uma prática de incentivo à utilização de código aberto, ao desenvolvimento e implantação de soluções nacionais, à criação de emprego tecnológico e ao fomento da Engenharia Informática no país? Porque será que se privilegia a aparência e se ignoram as condições para o suporte de medidas eficazes? Porque se desenvolve para o imediato e não se constrói para o futuro?

Costuma dizer-se que as grandes crises geram oportunidades. A avaliar pelo tamanho da crise que atravessamos, certamente existirão grandes oportunidades na área informática. Precisamos, no entanto, que nenhuma oportunidade para integrar componentes e desenvolvimentos nacionais seja perdida. Precisamos, mais do que nunca, de dar à Engenharia Informática nacional a oportunidade de mostrar que pode contribuir de forma relevante para ultrapassar a crise que a todos afecta. Temos no país muito bons técnicos e especialistas na área informática, bem como muito bons cursos de nível médio e superior. Resta-nos, afinal, tirar partido não só da prata da casa, mas também do ouro e do bronze.

terça-feira, 5 de abril de 2011

Boa ou má ideia?


Artigo de opinião publicado no diário ‘As Beiras’
em 4 de Abril de 2011


Só os menos esquecidos de entre os mais velhos se lembrarão dos grandes e desajeitados computadores de há trinta ou quarenta anos atrás e das formas como se podia interagir com essas estranhas máquinas, então reservadas para o uso de cientistas, engenheiros ou técnicos especializados. Uma dessas formas consistia na utilização de cartões perfurados, simpáticas cartolinas de 82 por 187 milímetros, de várias cores, onde se podiam registar até 80 caracteres.

Os cartões perfurados tinham uma utilidade bem definida: servir de suporte a informação. Por um lado, o utilizador poderia, por exemplo, escrever os seus programas paulatinamente, perfurando cada linha de código num único cartão. Dezenas ou centenas de linhas de código, agrupadas num maço de cartões, poderiam então ser lidas por um equipamento apropriado, fazendo com que o programa passasse para a memória do computador e pudesse ser executado.

O que é curioso registar é que, apesar de os cartões perfurados terem sido utilizados em máquinas tão “modernas” como os computadores de 1970 ou 1980, foram inventados em 1725 por dois operários têxteis franceses, Basile Bouchon e Jean-Baptiste Falcon, que os usaram para controlar teares, tendo o conceito sido aperfeiçoado nos cem anos seguintes, muito antes de existência de computadores.

Um outro exemplo de conhecimento aplicado aos computadores muitos anos depois do seu desenvolvimento é o da álgebra de Boole, ilustre matemático do século XIX, álgebra essa que está na base do funcionamento dos processadores e, portanto, é essencial para o Mundo tal como o conhecemos.

Serve isto para dizer que, como em muitas outras áreas da ciência e da tecnologia, também na informática existem muitos casos de ideias que foram importadas de outras áreas o que, não constituindo qualquer demérito, nos mostra que, afinal, uma boa ideia é sempre de considerar, independentemente da sua origem e do facto de ter ou não utilidade prática imediata.

Exemplos mais recentes são o dos próprios computadores, dos quais, quando apareceram, alguém disse que teriam uma utilidade e mercado muito reduzidos, o da Internet, da qual ninguém imaginaria o impacto futuro, o da World Wide Web, que projetou a Internet para a escala global, o das aplicações peer-to-peer, amadas por uns, odiadas por outros e usadas por quase todos e, por fim, o das redes sociais, que fundiram, de uma vez por todas, a Sociedade com a Internet.

É, portanto, difícil saber à partida se uma ideia, uma teoria ou uma tecnologia é boa ou má. Não existem métricas objectivas que possamos aplicar para aferir o potencial de uma ideia. Não existem avaliadores ou júris, por muito doutos que sejam, que o possam antever. O que pode parecer bom pode falhar. O que pode parecer inútil pode vir a ser revolucionário. Acima de tudo, temos que aprender a lição que a História nos dá: ter ideias é importante, mas mais importante ainda é manter o espírito aberto para as acolher e ter visão para as aplicar.