quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Quanto vale um computador?


Artigo de opinião publicado no diário ‘As Beiras’
em 19 de Outubro de 2010


A questão que serve de título não é, tal como muitas outras, de resposta simples, directa ou única. Mas porque estas coisas da informática toldam, frequentemente, a clareza e objectividade que deve presidir a qualquer análise, vale a pena fazer um esforço para encontrar uma entre muitas respostas possíveis.

Uma das dificuldades da questão vem do facto de existirem muitos tipos de computadores, para diferentes fins, com diferentes capacidades e diferentes graus de sofisticação.

Alguns computadores são ferramentas tão complexas, com um tão elevado poder de processamento e cálculo, que o seu valor pode atingir muitos milhões de euros. São, de facto, instrumentos científicos raros, só disponíveis em grandes instituições, laboratórios ou centros de investigação nacionais ou internacionais.

A maioria dos computadores são, no entanto, máquinas de médio ou de pequeno porte, utilizadas, por exemplo, para o fornecimento de serviços de comunicação ou serviços de processamento de informação numa multiplicidade de entidades ou empresas. Neste caso, para além do simples valor das máquinas e do software que nelas reside, há que ter em atenção o valor dos serviços que suportam e da informação que contêm. Em muitos casos, a indisponibilidade de um serviço ou a perda de informação representa um prejuízo muito maior do que o valor das máquinas ou do seu software, podendo, inclusivamente, ter consequências catastróficas. É por essa razão que qualquer bom administrador de sistemas executa regularmente operações de salvaguarda de dados (vulgo backups). Se não o fizer, pode – e deve – ser despedido com justa causa.

Já o valor de um computador pessoal depende, sobretudo, do valor da informação que nele reside, dado que como ferramenta é bastante comum. Um dia encontrei um amigo muito triste porque lhe tido sido dado – a título de compensação por danos no seu computador pessoal – um computador completamente novo. A questão é que a perda não se tinha resumido à máquina em si, mas sim a vários meses de trabalho que tinham conduzido à informação que ele lá tinha, da qual, lamentavelmente, não tinha cópia. Infelizmente, esse valor ninguém lho reconheceu nem retribuiu.

Avaliar um computador é, por isso, muito difícil. É como avaliar uma carteira sem a abrir, avaliar um cofre sem conhecer o seu conteúdo, avaliar uma prenda sem a desembrulhar ou avaliar uma pessoa por uma foto sem conhecer o seu carácter, a sua obra ou as suas competências.

Os computadores são, em grande medida, como folhas de um livro. O seu valor não se mede pelo papel de que são feitos mas sim pelo que neles se encontra. Podem conter escritos irrelevantes ou trabalhos de incalculável valor. No extremo, reduzir o valor de um computador ao valor de uma simples máquina seria como propor a Luís de Camões, acabado de chegar à praia após o naufrágio junto à foz do rio Mekong, com o seu manuscrito mor molhado e em mau estado, que trocasse essas degradadas folhas por uma novíssima resma de papel A4.

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Todos os nomes


Artigo de opinião publicado no diário ‘As Beiras’
em 4 de Outubro de 2010


Quase todos os dias somos ‘bombardeados’ com uma série de termos e siglas relativos às tecnologias da informação e comunicação (TIC). É certo que em todas as áreas da ciência e da tecnologia existe uma imensidão de termos técnicos – a maior parte dos quais totalmente incompreensíveis para o comum dos mortais – e também é certo que esse jargão é utilizado, frequentemente, como forma de demarcar a linha entre conhecedores e leigos. No entanto, a difusão das TIC é de tal ordem que a sua gíria nos invade a vida, se apropria da linguagem do dia-a-dia e se instala como vocabulário corrente e automático.

É social e politicamente incorrecto não incluir algures em conversas, textos ou debates um ou mais chavões como, por exemplo, redes de nova geração, banda larga, 3G, tecnologias da informação, Web2.0, realidade virtual, assinaturas digitais, comércio electrónico, desmaterialização, entre muitos outros, ainda que pouco se saiba quanto ao seu verdadeiro significado. Seria relativamente fácil elaborar uma lista com todos os nomes da moda – palavras chave, termos mágicos, buzzwords – que transformam qualquer documento num texto com aparente conteúdo e actualidade.

Muitas vezes dá a sensação de que quem utiliza esses termos acabou de ler um daqueles guias práticos que, de forma sucinta, ligeira e, por vezes, hilariante, prometem ao leitor sabedoria instantânea sobre determinado tema. Se fosse esse o caso seria menos mau mas, infelizmente, a maior parte das vezes nem isso acontece. Usam-se os termos e expressões porque toda a gente os usa.

É um pouco como as cerejas, que têm que ser de Resende, os Melões, que têm que ser de Almeirim, a pêra rocha, que tem que ser do Oeste, e assim sucessivamente, para que se possam vender em qualquer banca montada à beira da estrada, ainda que nada ateste a sua proveniência. O mesmo se passa com as redes, que têm que ser de nova geração, com a banda, que tem que ser larga, com a Web, que tem que ser 2.0, com a realidade, que tem que ser virtual, com as assinaturas, que têm que ser digitais e com a inteligência, que tem que ser artificial. Sem isso, qualquer solução informática é liminarmente rejeitada pelos ‘grandes especialistas’.

Bem vistas as coisas, este fenómeno é uma tendência natural que, em muitos casos, não traz grande mal ao Mundo. Há, no entanto, que ter algum cuidado quando a superficialidade das buzzwords é utilizada para definir estratégias, para lançar programas, para avaliar iniciativas ou para decidir sobre a execução de projectos. Nesses casos as consequências podem ser muito negativas, já que facilmente se embarca na construção de infraestruturas informáticas largamente sobredimensionadas, sistemas de informação desligados de necessidades reais e concretas, ou aplicações caras e mal concebidas. Desses temos muitos casos, cuja única utilidade prática fica reduzida ao dispendioso mas sonante marketing de todos os nomes.