segunda-feira, 4 de setembro de 2017

Fast food


Graças à utilização generalizada das tecnologias da informação e comunicação (TIC), vivemos num mundo inundado de informação, no qual nem sempre é fácil distinguir o que é irrelevante do que não o é, o que é falso do que é verdadeiro, o que é abusivo do que é adequado. Quando a informação é excessiva transforma-se, de facto, num mero conjunto de dados de significado e utilidade duvidosos. Por isso, um dos maiores desafios dos tempos de hoje é o de sobreviver a tanta informação, resistir à ânsia de assimilar tudo o que nos chega, separar o trigo do joio.

Neste contexto, seria de esperar que os órgãos de comunicação social tivessem aproveitado a oportunidade para se diferenciar, informando com qualidade, marcando claramente a diferença entre ruído e jornalismo mas, infelizmente, parece que a maioria decidiu nivelar por baixo. Assistimos, assim, a noticiários nos quais os principais critérios editoriais são os do imediatismo, da "notícia" bombástica, do usar e deitar fora. A imprensa escrita segue-lhes o caminho, exasperante na sua superficialidade, "análise" fácil e inexistência de investigação. Há que dar a notícia a todo o custo mas de forma rápida, acompanhando o ritmo frenético de chegada de dados.

Quando se pretende dar a ilusão de profundidade e jornalismo de rigor explora-se o lado sensacionalista e as emoções fortes, a entrevista à vítima direta da tragédia, a repetição exaustiva de notícias iguais ou semelhantes no mesmo ou em diferentes contextos, numa tentativa de que o espetador ou leitor confunda drama em quantidade com qualidade noticiosa. Pensa-se, então, que se atingiu o auge da profissão, mas a realidade não podia ser mais distinta: bateu-se no fundo.

O resultado imediato do acesso generalizado à informação foi, ao que parece, o 'fast food' jornalístico, que enche o 'estômago' e anquilosa as 'artérias' do pensamento e análise crítica. Não se usaram os meios proporcionados pelas TIC para fazer melhor, mas sim para fazer mais e pior.


Felizmente, nem tudo é mau. Existem já vários órgãos de comunicação que perceberam o erro e exploram agora o chamado 'jornalismo lento'. Talvez agora possamos ver que acesso generalizado a informação e jornalismo de qualidade não são incompatíveis, antes pelo contrário.  Há, apenas, que utilizar o poder das TIC para trabalhar melhor e fazer bem aquilo que nunca deveria ter sido feito mal.

sexta-feira, 12 de maio de 2017

Guerra e paz


Todos nós já ouvimos falar de ciber-ataques, dirigidos não só a pessoas, mas também a empresas, organizações e países. Ao abrir uma porta para o mundo, as tecnologias da informação e comunicação (TIC) abrem, simultaneamente, pontos de ataque às nossas "casas digitais", ou seja, aos nossos equipamentos e contas pessoais, aos serviços, bases de dados e sistemas de informação das empresas, aos serviços públicos e governamentais, aos sistemas militares e a todas as infraestruturas críticas. 

É claro que os mecanismos e ferramentas de segurança informática têm evoluído muitíssimo nos últimos anos, mas não é menos certo que o mesmo se passa com os tipos de ataques. Não se pense que os ataques informáticos são só coisa de filmes de Hollywood, pois eles ocorrem literalmente a cada instante, em todo o mundo e com uma intensidade e eficácia que deixariam espantado o cidadão comum. Há muitos anos que se trava uma guerra sem tréguas nem quartel entre os "bons" e os "maus", sem vencedores claros.

O mundo já não funciona sem TIC. Quase todas as empresas, sejam elas pequenas, médias ou grandes, têm presença na Internet e muitas delas dependem disso de forma crítica. No entanto, cerca de um terço das empresas já foi alvo de ataques informáticos, cujos efeitos podem ser tão variados como a interrupção dos serviços, a perda de informação, o roubo de dados de clientes, a chantagem e consequente pedido de resgate, ou o desvio de fundos, entre muitos outros.

Nesta matéria é surpreendente verificar que os organismos governamentais são também alvo de ataques informáticos bem sucedidos. As fragilidades devem-se a um conjunto variado de fatores, como sejam a falta de cultura de segurança informática, a escassez ou inexistência de meios humanos especializados,  a deficiente comunicação entre os especialistas e os decisores e, ainda, a incapacidade tecnológica. Para além disto, também é preocupante a crescente exposição de infraestruturas críticas aos ataques informáticos como, por exemplo, infraestruturas de telecomunicações, de produção e transporte de energia, de distribuição de água, de controlo de tráfego, ou de cuidados de saúde. 


No entanto, casos recentes relacionados com eleições em diversos países mostram o nascimento de um novo tipo de ataque, de que é alvo a infraestrutura mais crítica de todas: a democracia. Ao que parece há uma enorme apetência por desestabilizar países e sociedades, gerando tensões e conflitos que, nos dias de hoje e graças às TIC, rapidamente atingem uma dimensão global e podem dissolver a ténue linha entre a ordem e o caos, entre o errado e o certo, ou entre a guerra e a paz. Infelizmente, não só para o progresso servem as TIC.