quarta-feira, 16 de junho de 2010

Sabe o que fazem os seus filhos (na Internet)?


Artigo de opinião publicado no diário ‘As Beiras’
em 14 de Junho de 2010


É já um lugar comum dizer que a Internet pode constituir uma ameaça para muitas das crianças e jovens que a utilizam e que em relação a ela criam dependências cada vez mais preocupantes. À distância de alguns cliques encontra-se todo um mundo – mistura de realidade e ficção – que, de forma mais ou menos velada, pode entrar pela casa de cada um. Naturalmente, a primeira reacção de muitos pais preocupados é a de levantar barreiras a essa entrada, numa tentativa desesperada de impedir a ‘invasão’.

Como primeira arma, alguns pais recorrem a filtros, bloqueios e monitorização da actividade na Web. Gastam-se, por vezes, horas a experimentar ou afinar configurações e soluções de filtragem e monitorização que, diga-se de passagem, a maioria dos jovens ultrapassa facilmente. Trata-se de mecanismos tecnológicos, pouco eficazes, que não lidam com o problema principal, que é de natureza social.

Sendo certo que, ao contrário de muitos jovens, a esmagadora maioria dos pais – e, também, dos educadores e professores – não está tecnologicamente preparada para lidar com os desafios da Internet e das tecnologias da informação e comunicação (TIC), não é menos certo que estão ainda menos preparados para enfrentar a revolução social que estas tecnologias provocaram.

A Internet mudou radicalmente as formas de interacção e comunicação e, por conseguinte, as formas de socialização. Pela sua natureza, os jovens exploram todos os mecanismos de comunicação, privilegiando, naturalmente, novas formas de acesso à informação e a conteúdos, nas quais se incluem o instant messaging, o acesso Web, os blogs e as redes sociais. A sua necessidade de comunicação e interacção é de tal forma grande que, na maior parte dos casos, tal necessidade se sobrepõe à evidente falta de privacidade que muitos desses meios potenciam. Faz-se e tolera-se na Net aquilo que nunca se admitiria na vida real.

Por seu lado, os adultos têm dificuldade em acompanhar a rapidez de aprendizagem e de adaptação dos jovens, já para não falar da rapidez de mudança do Mundo que, como alguém disse, ‘mudou nas últimas três semanas’. E a rapidez da mudança é tal que têm dificuldade em compreender que o problema não está na mudança, mas sim na forma como se lida com ela.

Mais importante do que estabelecer regras, filtros ou proibições é levar as crianças e os jovens a compreender riscos, identificar ameaças e tomar decisões, estejam os perigos na Net ou fora dela. Mais importante do que levantar barreiras tecnológicas e perder horas a estudar e configurar filtros é aplicar esse mesmo tempo a quebrar barreiras geracionais, falando com os jovens sobre esse e todos os outros assuntos. Mais importante do que saber o que os seus filhos fazem na Internet é ganhar a sua confiança para que eles lhe falem sobre o que fazem em todo o lado. Se isso for conseguido, então a Net será para todos – adultos e jovens – um estimulante desafio e nunca uma ameaça.

terça-feira, 1 de junho de 2010

A pandemia silenciosa


Artigo de opinião publicado no diário ‘As Beiras’
em 31 de Maio de 2010


Apesar de dezenas de milhares de anos de Civilização, todos reconhecemos que não são hoje poucos os factores que constantemente a ameaçam. Alguns destes revelaram-se recentemente como especialmente perigosos: as catástrofes naturais e as pandemias de gripe. Terramotos e tsunamis reclamam vidas e destroem países. Vulcões paralisam continentes, provocando perdas económicas avultadíssimas. A recente pandemia de gripe H1N1 – felizmente muito menos mortífera que a provocada pela variante do mesmo vírus que, em 1918-1919 matou entre 50 a 100 milhões de pessoas – realçou, mais uma vez, a fragilidade de pessoas, organizações, sistemas produtivos e sistemas económicos.

A par com as forças da natureza que nos relembram todos os dias a nossa extrema fragilidade, uma outra pandemia grassa, silenciosa e ameaçadora: os vírus informáticos.

Julgará o leitor que muito exagero existirá nesta curiosa afirmação. Por um lado, que mal virá ao Mundo pelo facto de existirem vírus informáticos? Por outro, será que são assim tantos os computadores infectados, a ponto de fazerem alguma diferença? É precisamente por se negligenciar uma ameaça que ela se torna muito mais perigosa. Analisemos, então, a questão.

Os computadores e as redes que os interligam são, hoje em dia, indispensáveis para todas as infra-estruturas críticas. Nestas incluem-se as redes de produção e distribuição de energia, as redes viárias e de transportes, os serviços de emergência, os sistemas hospitalares, entre muitas outras. Todas as actividades de produção e de serviços dependem de forma crítica das tecnologias da informação e comunicação (TIC). Na eventualidade dos sistemas informáticos serem afectados em larga escala por vírus, ficando inoperacionais, as consequências poderiam ser muito mais graves do que as de um terramoto, de um tsunami ou de pandemias biológicas, podendo, mesmo, acarretar avultadas perdas de vidas humanas.

Será que tal cenário é possível? Existem casos documentados de ataques informáticos distribuídos que envolveram dezenas de milhões de máquinas – os chamados botnets - ou que tornaram inoperacionais durante várias horas grandes partes da Internet. Os botnets continuam a existir e a crescer em número e dimensão de dia para dia, sem que os utilizadores dos computadores que deles fazem parte – denominados zombies – estejam conscientes disso. Muitos botnets são ‘inofensivos’, mas há quem esteja interessado em causar o maior impacto negativo possível. E para esses, o expoente máximo será o vírus que consiga tornar inoperacional a maior parte dos computadores e da Internet, a qualquer preço, independentemente das consequências disso.

Tal como todos os bebés que, ao nascer, são já doentes, idosos de 9 meses, também os computadores vêm já ao Mundo sob a ameaça de uma pandemia instalada, silenciosa e galopante, que tem o real potencial para afectar de forma drástica a vida todos os seres do planeta.