quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Optar pelas nuvens, com os pés assentes na terra

Artigo de opinião publicado no diário ‘As Beiras’
em 22 de Fevereiro de 2010


Os organismos, entidades e empresas que têm os pés assentes na terra conhecem bem os custos de adquirir e manter infra-estruturas e serviços de TIC (tecnologias da informação e comunicação) com recurso a meios próprios. Para além de equipamento computacional, postos de trabalho, software e serviços, há que ter em atenção que as infra-estruturas de TIC exigem a atenção constante de gestores de sistemas e redes, profissionais especializados que têm a seu cargo a operação, manutenção, monitorização e optimização de todos os sistemas. Funções como a gestão de parques informáticos, gestão de configurações e gestão de segurança informática assumem um papel crítico nas modernas organizações, não podendo ser deixadas ao cuidado de ‘curiosos’ ou amadores, sob pena de se colocar em risco toda a actividade.

O desenvolvimento de tecnologias de rede capazes de funcionarem a elevados débitos (dezenas ou, mesmo, centenas de gigabits por segundo) potenciou que, presentemente, muitos dos serviços de TIC possam ser fornecidos remotamente, o que reduz em muito as necessidades de investimento, de operação e manutenção locais.

Recentemente, o conceito de grid computing – normalmente associado à cooperação de vários servidores interligados entre si, de forma a resolver um problema específico, tipicamente envolvendo cálculo intensivo – foi estendido, daí resultando o conceito de cloud computing. Neste caso, o que se pretende é a utilização de múltiplos recursos computacionais, interligados através da Internet (normalmente representada por uma nuvem, ou cloud) de forma a fornecer serviços aos utilizadores independentemente da sua localização e do dispositivo que estão a utilizar para se ligarem à rede. Os recursos (por exemplo, redes, servidores, espaço de armazenamento, aplicações ou serviços) são partilhados por diversas entidades ou utilizadores, disponibilizados a pedido e geridos com o mínimo de sobrecarga de gestão.

O conceito de cloud computing fornece vários modelos de funcionamento e de utilização de recursos, a saber:
  • Software as a Service (SaaS) – em vez de adquirir e instalar licenças de software para as diversas aplicações nos seus equipamentos, as entidades utilizadoras acedem a essas aplicações através da rede, pagando a sua utilização a um fornecedor de serviço;
  • Platform as a Service (PaaS) – um fornecedor de serviço disponibiliza uma plataforma de software para que as entidades utilizadoras desenvolvam as suas aplicações e as alojem;
  • Infrastructure as a Service (IaaS) – o fornecedor de serviço disponibiliza máquinas virtuais, nas quais as entidades utilizadoras podem instalar o seu próprio software de sistema e software aplicacional.

O paradigma da computação em nuvem é, cada vez mais, aceite e adoptado por organizações modernas, que sabem distinguir entre o que devem fazer elas próprias – porque nisso são especializadas – e o que devem adquirir a outros. É um modelo a ter em conta e a seguir pelas administrações central e local, que teimam em replicar até à exaustão serviços que todos poderiam partilhar, desperdiçando, desta forma, todo um potencial para economias de escala. É caso para dizer que optar pela computação em nuvem é a melhor forma de manter os pés assentes na terra.


Fernando P. L. Boavida Fernandes
Professor Catedrático da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra
Presidente do Conselho de Administração da Associação Coimbra Região Digital

Viagens na minha terra

Artigo de opinião publicado no diário ‘As Beiras’
em 8 de Fevereiro de 2010


Não vou falar de viagens em barco a vapor, nem de caminhos-de-ferro nem de estradas de pedra, até porque nem de longe nem de perto posso aspirar ao engenho do nosso ilustre romancista, poeta, dramaturgo e político do século XIX, Almeida Garrett (tão pequeno é o meu engenho, que tenho, até, que lhe pedir emprestado o título de uma sua obra prima). Vou, antes, falar daquilo que as modernas tecnologias podem fazer pelas viagens e pelos viajantes que as empreendem, por forma a mostrar o que por cá há e o que por cá se faz.

O forte desenvolvimento registado em anos recentes em termos de tecnologias da informação e comunicação, em particular nas áreas da Internet, comunicações móveis e convergência das redes de telecomunicações e redes de computadores, possibilita e potencia o desenvolvimento de um vasto leque de aplicações para as chamadas redes de conteúdos ou redes de comunidades.

As tecnologias e equipamentos existentes no mercado estão suficientemente estabilizadas para permitir o desenvolvimento de um conjunto de serviços extremamente inovadores, mesmo quando considerado o panorama internacional, que dêem resposta a um vasto leque de problemas, nos quais claramente se incluem problemas urbanos de grande relevância para as comunidades, abrangendo vertentes como a gestão do espaço público, a acessibilidade e mobilidade urbanas, o comércio electrónico móvel (m-commerce), a cultura e o lazer. Os utilizadores acederão aos serviços quer através de dispositivos móveis (telemóveis, PDAs) quer através de computadores pessoais (desktops, portáteis). Vejamos, no que se segue, alguns exemplo de possíveis serviços.

Agenda cultural – um serviço deste tipo poderá permitir que o utilizador tenha acesso à agenda cultural da cidade ou região, constituída por eventos publicados por um RSS feed. O utilizador poderá pesquisar e navegar pelos eventos/notícias disponíveis, podendo seleccionar um evento e colocá-lo na sua agenda pessoal.

História e monumentos – o serviço poderá alertar um utilizador para a proximidade de um monumento ou marco histórico relevante, à medida que ele se desloca na cidade, povoação ou região, disponibilizando-lhe informações variadas sobre esse ponto de interesse.

Circuitos turísticos – com este serviço será possível, por um lado, que um utilizador obtenha informação sobre circuitos turísticos e, por outro, que o utilizador registe a sua posição durante um passeio e possa analisar o seu trajecto posteriormente; poderá, ainda, assinalar pontos de interesse ao longo do trajecto e adicionar as suas próprias notas ou impressões.

Guia de transportes – um serviço deste tipo possibilitará, por um lado, que um utilizador consulte informação sobre os transportes urbanos (p. ex., linhas existentes, preços, horários) e, por outro, que este obtenha informação sobre quais os transportes a utilizar para viajar entre dois pontos da cidade ou região.

Gastronomia – com um serviço deste tipo será possível que o utilizador procure um restaurante numa lista pré-definida, quer por nome quer por características, seleccione um restaurante, faça uma reserva e armazene essa informação na sua agenda.

São inúmeras as aplicações potenciadas pelas novas tecnologias de comunicação móvel, sendo limitadas apenas pela imaginação. Referiram-se acima, a título de exemplo – e de desafio – apenas cinco possíveis tipos de serviços. Sejam eles um dia concretizados e “viajaremos com muito prazer e com muita utilidade e proveito na nossa boa terra”.


Fernando P. L. Boavida Fernandes
Professor Catedrático da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra
Presidente do Conselho de Administração da Associação Coimbra Região Digital

Resultados já ou soluções de futuro?

Artigo de opinião publicado no diário ‘As Beiras’
em 22 de Janeiro de 2010


Nos dias de hoje tudo parece imediato. Nalguns casos, todos apreciamos a capacidade que existe hoje em fazer certas coisas bem e depressa, pois tal está por detrás de muito do desenvolvimento das civilizações. As tecnologias da informação e comunicação são, sem dúvida um dos potenciadores desta mudança revolucionária.

Quantas vezes, no entanto, os maravilhosos resultados imediatos comprometem a adopção de soluções de futuro? Infelizmente, na área do e-government – seja ele local ou não – vezes de mais se privilegia o impacto do imediato em detrimento da modernização consistente e planeada. Analisemos um pouco mais esta questão.

Muitas das iniciativas de modernização a que assistimos hoje estão assentes no pressuposto de que disponibilizando financiamento os resultados aparecem. A dura realidade mostra-nos que tal não é assim.

Primeiro, há que saber direccionar o financiamento para acções e actividades que tenham em vista a criação de condições infra-estruturais, isto é, para acções e actividades que criem a base sobre a qual se vai proceder à modernização. Há, também, que produzir linhas de orientação para o desenvolvimento dessas infra-estruturas – sejam elas físicas (por exemplo, redes, equipamentos, servidores), ou lógicas (por exemplo, sistemas de informação, ambientes aplicacionais) – sob pena de se aumentar a já demasiada elevada ‘entropia’. Tal compete, em grande medida, às entidades financiadoras.

Em seguida, há que apoiar a Administração Pública na definição de projectos concretos, globalmente consistentes e tecnologicamente niveladores, evitando-se assim um Estado a muitas velocidades, onde os que têm mais capacidade técnica e humana se modernizam e os restantes ficam cada vez mais para trás. Tal só conduz a desequilíbrios altamente prejudiciais para as regiões e, consequentemente, para as populações, sendo totalmente injustificado num País tão pequeno como o nosso. Infelizmente, a cultura da ‘competição’ – sempre apregoada como salutar – tem acentuado este efeito pernicioso, conduzindo a que o Estado compita com ele próprio e acentue as desigualdades no seu seio.

Para além disso, há que investir nos recursos humanos, sobretudo em termos de formação. Naturalmente, tem, ainda, que se proceder a um acompanhamento técnico – e não meramente formal ou administrativo – de todos os projectos, assegurando que produzem resultados adequados.

Em resumo, há que definir linhas de acção devidamente estruturadas e coordenadas, elaborar linhas de orientação, promover o nivelamento tecnológico e acompanhar, de um ponto de vista técnico, a execução dos projectos. Tem que se ultrapassar, de uma vez por todas, a cultura dos ‘resultados imediatos a qualquer preço’ e trabalhar para o desenvolvimento e modernização a médio e longo prazo. É isso que é feito nos países mais desenvolvidos, que definem planos e programas a dez ou quinze anos. Naturalmente que tal tem que ser feito envolvendo todos os parceiros relevantes, que incluem a administração central, a administração local e, não menos importante, as cidades e regiões digitais. Só assim se pode consolidar os resultados de hoje e trabalhar todos os dias para um melhor Amanhã.


Fernando P. L. Boavida Fernandes
Professor Catedrático da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra
Presidente do Conselho de Administração da Associação Coimbra Região Digital

Conserto de Ano Novo

Artigo de opinião a publicar no diário ‘As Beiras’
em 4 de Janeiro de 2010


Julgará o leitor mais atento que existe um erro ortográfico no título, pois onde está ‘Conserto’ deveria estar ‘Concerto’. No que toca o e-Government local vejamos, no entanto, algumas razões para consertar (arranjar, reparar) alguns dos problemas que o afectam.

Nos últimos anos tem-se registado uma clara mudança, no sentido positivo, no estado de desenvolvimento do e-Government local. A mudança maior é, em meu entender, a mudança de atitude dos decisores e demais agentes da Administração Local, que tem levado a uma forte consciencialização da necessidade de optimizar processos e de prestar serviços aos cidadãos com a maior qualidade possível.

Paradoxalmente, essa maior consciencialização tem levado, em muitos casos, a uma ânsia de maximizar as medidas imediatistas e visíveis, em detrimento de medidas de fundo que levem a uma eficaz reestruturação e modernização. Neste contexto, são implementadas no terreno muitas medidas desgarradas que, a prazo, vão piorar a situação, dado que aumentam o número e complexidade de sistemas e não potenciam a adopção de soluções globais integradas.

Existe, assim, muito trabalho a fazer, que se poderá agrupar em três grandes áreas: infra-estruturas de TIC; sistemas de informação e aplicações; conteúdos e serviços on-line.

As actuais infra-estruturas estão, em geral, mal dimensionadas, deficientemente geridas e razoavelmente inseguras. Nesta vertente há uma claríssima necessidade de definição de uma arquitectura de referência e de recomendações em termos de tipos de soluções a implementar.

O desafio maior é, porventura, na área dos sistemas de informação. Actualmente, a maior parte das autarquias utiliza uma variedade de sistemas de informação parciais, cada um para a sua área ou sector, que não comunicam entre si. Isto leva a todo o tipo de ineficiências, prejudicando fortemente o desempenho e constituindo o maior obstáculo à disponibilização de serviços on-line. A integração dos diversos sistemas de informação parciais é, assim, uma prioridade.

É na área dos conteúdos e serviços on-line que têm ocorrido os maiores desenvolvimentos, especialmente na vertente de conteúdos. Apesar disso, ainda há bastante trabalho a fazer, em particular na selecção e garantia de qualidade dos conteúdos e, sobretudo, no aumento do número de serviços on-line. A este respeito, há que não esquecer que conteúdos em excesso são, por vezes, mais prejudiciais do que benéficos, pois dificultam o acesso à informação verdadeiramente útil. Por outro lado, idealmente, todo e qualquer serviço prestado de forma presencial deveria também poder ser prestado on-line, o que ainda está longe de acontecer.

De notar que muito do trabalho a realizar nas áreas dos sistemas de informação e das infra-estruturas exige meios humanos e financeiros consideráveis e não é, de imediato, visível para o exterior. Tem, por isso, sido evitado pelo poder local. Uma forma de resolver este problema será lançar programas/projectos específicos para o efeito, cujo sucesso não seja medido pela concretização de um número mais ou menos elevado de medidas visíveis para o utilizador, mas sim pela efectiva e quantificada melhoria de sistemas e infra-estruturas. Infelizmente, as actuais iniciativas e modelos de financiamento não têm direccionado o desenvolvimento para estas áreas fundamentais o que, em muitos casos, dificulta seriamente o desempenho, o fornecimento de serviços e a disponibilização de conteúdos. Se tal tivesse acontecido, estaríamos agora a falar de Concertos de Ano Novo e não de um tão necessário Conserto para o Ano de 2010.


Fernando P. L. Boavida Fernandes
Professor Catedrático da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra
Presidente do Conselho de Administração da Associação Coimbra Região Digital

Que outro valor mais alto se alevanta

Artigo de opinião publicado no diário ‘As Beiras’
em 14 de Dezembro de 2009


Peguemos num jornal ou revista de economia e, inevitavelmente, nalgum ponto aparece um artigo ou um trecho que se refere a tecnologias da informação e comunicação (TIC). Peguemos num jornal ou revista de informática e, inevitavelmente, encontramos uma referência à economia. Em regra, pensa-se sempre no impacto que desenvolvimentos tecnológicos têm sobre a economia e vice-versa. No entanto, nos dias de hoje, pensar na economia não basta, já “que outro valor mais alto se alevanta”: o futuro do Planeta. As ameaças ao ambiente são, infelizmente, muitas, sendo importante tentar perceber de que forma podem as TIC ajudar na sua preservação.

Essencialmente podemos usar as TIC para três categorias de tarefas: 1) avaliar o ambiente e monitorizar a evolução de parâmetros fundamentais; 2) utilizar de forma mais eficiente os recursos existentes; 3) sensibilizar os cidadãos e divulgar boas práticas.

A primeira categoria de tarefas pode ser efectuada com recurso a redes de sensores, com ou sem fios. Este tipo de redes permite obter em tempo real – e de forma continuada – valores para uma série de parâmetros físicos como, por exemplo, temperatura, pressão, humidade, movimento, concentração de poluentes, etc., à escala de um processo industrial, de uma empresa, de uma cidade, de uma região, de um país ou do Globo. Utilizando redes de sensores acessíveis pela Internet é possível desenvolver e operar aplicações de controlo ambiental a partir de qualquer ponto do mundo, que alimentarão bases de dados e de informação vitais para compreender melhor e acompanhar quaisquer variações ambientais.

Quanto à utilização eficiente de recursos, as TIC podem ajudar de múltiplas formas. Por exemplo, é quase lugar comum dizer que com a informática há uma forte redução do papel em escritórios e organismos públicos e privados. Infelizmente, a prática é bem diferente. Se compararmos os gastos de papel antes e depois da generalização dos meios informáticos, facilmente constatamos que cada vez se gasta mais papel. Nesta matéria há que mudar práticas e legislação que, na maior parte dos casos, obriga, irracionalmente, a que a informação esteja em suporte de papel, mesmo sabendo que o suporte digital é mais duradouro, mais fiável e mais resistente a falsificações. Há, por exemplo, que generalizar a utilização dos mecanismos de assinaturas digitais, que têm já o mesmo valor legal das assinaturas manuscritas. A este respeito pode perguntar-se: quantos actos legais (por exemplo, em notários, tribunais, ministérios ou autarquias) são efectuados com recurso a assinaturas e documentos digitais?

A área na qual as TIC têm, sem margem para dúvida, tido o maior impacto é na sensibilização dos cidadãos. A Internet tem, entre muitos males e bens, o valor inestimável de dar voz aos cidadãos. Hoje em dia, qualquer pessoa pode produzir e publicar conteúdos na Internet. Quer as organizações quer os cidadãos individuais podem ‘fazer-se ouvir’, levando políticos, decisores e governos a actuar. E é de actuação que o planeta Terra precisa, para que possamos, de vez em quando, esquecer a economia, esquecer as TIC e reconhecer, com um sorriso confiante que, como escreveu Fernando Pessoa, “Grande é a poesia, a bondade e as danças... Mas o melhor do mundo são as crianças”.


Fernando P. L. Boavida Fernandes
Professor Catedrático da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra
Presidente do Conselho de Administração da Associação Coimbra Região Digital

Ovelhas não são para mato

Artigo de opinião publicado no diário ‘As Beiras’
em 28 de Novembro de 2009


A informação é, para muitas das actuais organizações, o bem mais precioso. Porque tal facto é verdadeiro também para a Administração Local, tem esta efectuado um forte investimento em serviços de TIC (tecnologias da informação e comunicação), o que parece lógico e adequado. Neste contexto, cada município constitui os seus próprios serviços e correio electrónico, páginas Web, bases de dados, sistemas de informação, etc., com os consequentes gastos em equipamento, software, aplicações, licenciamento, manutenção e recursos humanos.

Será essa a estratégia adequada? Não se estará a confundir informação com serviços informáticos? Competirá às autarquias ‘reinventar a roda’ e ter caras infra-estruturas para assegurar serviços para os quais não estão nem devem estar vocacionadas? Não deverão as autarquias seguir o exemplo de inúmeras entidades empresariais por este Mundo fora, que recorrem a serviços de informática externos, sem prejuízo do total controlo sobre a sua informação?

De uma maneira geral, os profissionais da Administração Local são competentes e empenhados e conhecem bem os pontos fortes e fracos dos mecanismos, procedimentos, processos, sistemas e serviços. No entanto, sem ferramentas adaptadas às necessidades pouco pode ser feito para melhorar a eficiência e a qualidade do trabalho. Por ferramentas adequadas entende-se infra-estruturas de informática e comunicações, software adaptado e capaz de suportar processos optimizados, soluções globais testadas e a funcionar.

Naturalmente que não compete à Administração Local desenvolver essas ferramentas. Apesar disso, são muitas as tentativas para o fazer, inevitavelmente com resultados muito aquém das expectativas ou, até, com total fracasso. O papel da Administração Local nesta matéria deve ser o de definir requisitos, avaliar alternativas existentes, contratar desenvolvimento se não existirem soluções ‘chave na mão’ e supervisionar a sua correcta aplicação no terreno. Também naturalmente, em todos estes processos deve a Administração Local socorrer-se de aconselhamento especializado.

Aqui o papel das regiões digitais pode ser crucial e extremamente benéfico. Para além do aconselhamento especializado, as regiões digitais podem estar na base do fornecimento de soluções globais de serviços comuns de comunicações (por exemplo, soluções de e-mail, Web, etc.), de soluções aplicacionais disponíveis para todos os seus associados (por exemplo, soluções de gestão de processos, de facturação electrónica, de logística, de informação geográfica, de serviços on-line, etc.) e de soluções para disponibilização de conteúdos (por exemplo, plataformas de informação cultural, histórica, turística, etc.). Ao fornecer-se soluções globais e homogéneas, potencia-se a redução de custos por via da utilização eficiente de meios humanos e materiais, a replicação de soluções testadas e, não menos importante, a comunicação dentro de e entre diferentes administrações locais.

Às regiões digitais pode – e deve – deixar-se a espinhosa tarefa do desenvolvimento e fornecimento de soluções informáticas eficazes, libertando as autarquias para as funções para as quais têm vocação e elevada competência. Como diz a sabedoria popular, “ovelhas não são para mato”.



Fernando P. L. Boavida Fernandes
Professor Catedrático da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra
Presidente do Conselho de Administração da Associação Coimbra Região Digital

O lado complexo do Simplex

Artigo de opinião publicado no diário ‘As Beiras’
em 13 de Novembro de 2009

Nos últimos anos temos sido bombardeados com um novo conceito: o Simplex. A força do neologismo parece funcionar como panaceia para muitos dos males da Administração Pública e não só (fala-se já de Simplex para a Ciência). Concentremo-nos no Simplex Autárquico e tentemos analisar objectivamente em que consiste.

A visão estratégica integrada subjacente ao programa Simplex Autárquico é adequada, compreendendo a optimização do funcionamento interno dos serviços municipais, a melhoria da qualidade dos serviços prestados aos munícipes, a promoção de uma melhor interacção entre diferentes administrações públicas e, ainda, a melhoria da transparência das actividades das autarquias.

Infelizmente, definir uma visão estratégica é apenas o primeiro passo para atingir objectivos, faltando, depois, a concretização que os permite alcançar.

As quase trezentas medidas definidas no programa de 2009/2010 do Simplex Autárquico têm naturezas distintas, dependendo da sua abrangência. As medidas inter-sectorias e inter-municipais são, de uma maneira geral, uma lista de funcionalidade desejáveis, umas em fase de levantamento de requisitos, outras em fase de projecto piloto e, a maioria, muito longe de uma concretização devido à sua complexidade. Deste ponto de vista, poder-se-ia dizer que o Simplex é, afinal, Complex, não porque pretenda complicar processos mas porque a sua efectiva implementação no terreno está longe de ser trivial. Quanto às mais de duas centenas e meia de medidas municipais são, salvo raras excepções, medidas desgarradas, pontuais, não integradas numa visão global de sistema de informação autárquico que, no imediato, exploram potencialidades isoladas das tecnologias de informação e comunicação, mas não resolvem problemas de fundo.

Nota-se, claramente, que a preocupação de muitos intervenientes no Simplex é a de mostrar que ‘há coisas a mexer’, essencialmente recorrendo à intensiva disponibilização de informação on-line, através de portais municipais que, na maioria dos casos, estão já sobrecarregados com informação.

Em termos de medidas a tomar, tem que começar-se por medidas infra-estruturais e de reorganização. Estas são as mais difíceis de implementar, por vários factores: exigem uma análise cuidada, alteram hábitos e processos, têm impacto nos sistemas de informação e, sobretudo, não são visíveis no imediato (o que dá a sensação errada de que nada está a ser feito ou de que o que foi feito para nada serve). Uma lista de muito alto nível poderia ser a seguinte:

  • Linha de acção 1 – reengenharia de processos
  • Linha de acção 2 – definição de uma arquitectura para sistemas de informação autárquicos
  • Linha de acção 3 – reformulação e racionalização de infra-estruturas e serviços de TIC
  • Linha de acção 4 – definição e instalação de aplicativos
  • Linha de acção 5 – disponibilização de serviços e informação on-line

Note-se que, actualmente, na maioria dos casos as medidas tomadas se encaixam na linha de acção 5, ficando as restantes – que a deveriam preceder - completamente a descoberto. Simplificar processos não pode ser sinónimo de ‘superficializar’ processos. Exige trabalho sério e medidas de fundo que, por um lado, simplifiquem a interface com o utilizador e, por outro, optimizem processos que, muitas vezes, são de complexidade inevitável.

Dado o seu papel estruturante e a sua vocação para a realização e coordenação de projectos abrangentes de natureza intra e inter-municipal, as Regiões Digitais poderão desempenhar um papel significativo em todo este processo.



Fernando P. L. Boavida Fernandes
Professor Catedrático da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra
Presidente do Conselho de Administração da Associação Coimbra Região Digital

O ‘face lifting’ das TIC

Artigo de opinião publicado no diário ‘As Beiras’
em 30 de Outubro de 2009

A modernização e simplificação administrativas estão na ordem do dia, quer no que respeita a Administração Central quer no que respeita a Administração Local. Nesta matéria, quais devem ser as principais preocupações a ter em conta?

Quer a modernização quer a simplificação administrativas são processos que exigem um cuidado planeamento, que tem que passar por uma identificação precisa dos objectivos, das soluções, das metodologias, dos recursos humanos e, por fim, dos recursos financeiros. Como processos de engenharia ou reengenharia que são, têm que ser ponderados os riscos, os custos e os benefícios.

A modernização e a simplificação não podem ser encaradas como uma mera mudança de suporte de informação – do papel para o computador – ou, ainda, como uma mera mudança de canal de comunicação – do atendimento presencial para a interacção, quantas vezes demasiado rígida, via Internet – sob pena de se continuar a fazer os mesmos erros, agora com recurso às tecnologias da informação e comunicação (TIC). Infelizmente, são relativamente comuns os casos em que a informatização serve de justificação e desculpa para a inflexibilidade e para a prestação de serviços de má qualidade.

Neste contexto, as principais preocupações da Administração Local em matéria de modernização e simplificação administrativas devem centrar-se na identificação dos objectivos a atingir e na definição da estratégia a utilizar para os alcançar, de acordo com o seguinte:
• Objectivos de modernização e simplificação – quais os serviços de utilizador que se pretende melhorar e porquê? Que processos e fluxos de informação existem? Quais os seus problemas e fragilidades? Destes, quais são os que mais afectam o desempenho e a qualidade dos serviços prestados? Como poderiam ser melhorados? Existem riscos decorrentes da alteração desses processos e fluxos? Quais os benefícios dessa alteração?
• Estratégia a utilizar – A resposta às questões anteriores deve ser seguida de um estudo que permita a definição da estratégia a utilizar para atingir os objectivos traçados. Esse estudo deve contemplar aspectos como a arquitectura dos sistemas de informação subjacentes, as tecnologias e aplicativos a utilizar, os requisitos em termos de infra-estruturas de comunicação e processamento, os meios humanos envolvidos, os custos de implantação e de manutenção, as etapas e respectiva calendarização para a implementação.

Em resumo, é necessário definir o que fazer e como o fazer. De uma maneira geral, a Administração Local sabe bastante bem o que gostaria de fazer em termos de modernização e simplificação administrativas. Já o mesmo não se pode dizer quando ao ‘como fazer’.

Assim, as principais preocupações devem ser de planeamento e projecto, que constituem a única forma de caminhar para sistemas de informação coerentes e abrangentes, capazes de suportar a melhoria dos serviços.

Há que resistir, por todos os meios, à tentação de implantar no terreno soluções pontuais e parcelares que, no imediato, são um mero ‘face lifting’, dando a sensação de que há modernização. Infelizmente, no médio prazo essas soluções criam, frequentemente, sérios obstáculos à integração de sistemas de informação e à eficácia das interacções dentro e para o exterior dos serviços.

É na área do ‘como fazer’ que as regiões digitais podem desempenhar um papel que poderá ser bastante relevante.



Fernando P. L. Boavida Fernandes
Professor Catedrático da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra
Presidente do Conselho de Administração da Associação Coimbra Região Digital

Tecnologias de Informação e Comunicação – Motores de Mudança

Artigo de opinião publicado no diário ‘As Beiras’
em 16 de Outubro de 2009


Apesar do desenvolvimento das primeiras redes de comunicação e das tecnologias que dariam lugar à actual Internet ter começado no início dos anos 1960, a ‘explosão’ da Internet – acompanhada da generalização da utilização de uma série de tecnologias de informação e comunicação (TIC) – só se deu na década de 1990. Até essa altura, a rede global era a rede telefónica, cobrindo todo o planeta e fornecendo um restrito leque de serviços fortemente centrado nos serviços (analógicos) de voz.

Hoje o mundo seria impensável sem a rede Internet e sem a variedade de tecnologias de informação e comunicação que lhe estão associadas, dado que, virtualmente, todos os sectores de actividade se apoiam nelas, directa ou indirectamente.

Qual foi o factor primordial para a drástica mudança que ocorreu nos anos 1990? Há duas respostas para esta questão. Em termos tecnológicos, o factor chave foi o desenvolvimento da World Wide Web. O factor primordial foi, no entanto – e como sempre – o factor de motivação humana. De repente, um manancial de informação passou a estar disponível a um número crescente de utilizadores de forma extremamente simples e cómoda. O interesse dos utilizadores gerou uma forte procura o que, por sua vez, motivou uma oferta crescente. Por outro lado, as possibilidades em termos de serviços passaram a contemplar um leque variado, que incluía correio electrónico, instant messaging, envio e partilha de ficheiros, comércio electrónico, entre outros. Mais recentemente, a estes juntaram-se serviços como o serviço de voz ou de televisão.

A mudança potenciada pela Internet, fortemente suportada na procura por parte dos seus utilizadores, foi de tal ordem que a generalidade dos operadores de telecomunicações viu o seu negócio mudar radicalmente no espaço de poucos anos, levando-os a recentrar a sua actividade no fornecimento de serviços de Internet, integralmente apoiados em tecnologias digitais de comunicação.

Com a disponibilização comercial de serviços e tecnologias de Internet, abriram-se as portas a que uma multiplicidade de serviços, até aí prestados de forma presencial, pudessem passar a estar acessíveis on-line a qualquer utilizador, independentemente da sua localização física. Naturalmente que, num cenário destes, um enorme campo se abriu: o da modernização administrativa apoiada nas TIC passando, necessariamente, pela disponibilização de serviços da Administração Pública através da Internet.

É nessa modernização administrativa que a Associação Coimbra Região Digital actualmente aposta, promovendo e apoiando projectos tão variados como o desenvolvimento de portais municipais, o estabelecimento de plataformas para disponibilização de serviços autárquicos on-line aos munícipes, o fornecimento de produtos e serviços informáticos para os associados (municípios, empresas e entidades de interface universidade-empresa) e a disponibilização de uma plataforma tecnológica e aplicacional de suporte à logística municipal.



Fernando P. L. Boavida Fernandes
Professor Catedrático da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra
Presidente do Conselho de Administração da Associação Coimbra Região Digital

Alguns Riscos e Problemas das TIC na Administração Pública


Artigo de opinião publicado no diário ‘As Beiras’
em 2 de Outubro de 2009


O potencial das tecnologias de informação e comunicação (TIC) na Administração Pública é largamente conhecido e tem vindo a ser explorado no contexto de inúmeras iniciativas de modernização administrativa. Tratando-se de uma área para a qual, numa boa parte dos casos, existe um défice de know-how quer por parte dos utilizadores, quer por parte de pessoal técnico e especialista, quer, ainda, por parte de decisores – ao que não é estranha a novidade e a rápida evolução que a caracterizam – a área das TIC na Administração Pública não é, no entanto, isenta de riscos e de problemas. Porque conhecê-los é o primeiro passo para lidar com eles, no que se segue são referidos alguns dos mais relevantes.

Um dos principais riscos é o da segurança informática. Ao interligar sistemas em rede e ao permitir o acesso de utilizadores através da Internet, existe a possibilidade de que redes, servidores, serviços e informação fiquem expostos a ataques por parte de utilizadores e/ou máquinas remotos. Infelizmente, a área da segurança de sistemas e redes é uma das mais descuradas, quer por desconhecimento quer por incapacidade técnica, o que contribui de forma decisiva para o demasiado elevado número e tipo de vulnerabilidades de máquinas e redes ligadas à Internet. A segurança é uma área que deve ser tida em conta em todas as fases da vida de uma infra-estrutura, a começar pelas fases de planeamento e projecto e não descurando, naturalmente, as fases de operação e manutenção.

Um outro problema comum é o da inadequação de infra-estruturas e equipamentos. Frequentemente, as infra-estruturas de rede estão mal dimensionadas e/ou desactualizadas tecnologicamente, o que causa problemas a todos os níveis. Tal deve-se, amiúde, a um deficiente planeamento e projecto – nos casos em que esse planeamento e projecto existiram. A constituição de qualquer sistema, aplicação ou rede informáticos deve estar sujeita a uma rigorosa análise de requisitos, a que se deve seguir uma especificação detalhada e uma implementação devidamente controlada.

É, também, devido a mau planeamento e especificação que, dentro da mesma entidade ou serviço, seja relativamente comum a existência de diferentes sistemas de informação não integrados, o que leva à ‘fragmentação informática’ da entidade em diferentes domínios entre os quais a informação circula difícil ou ineficazmente. Por vezes, é necessária uma exportação/importação quase manual entre diferentes sistemas de informação, o que leva a fortes limitações e a custos desnecessários.

Por outro lado, é frequente que os orçamentos de serviços/sectores não tenham em conta custos de operação, manutenção, actualização e crescimento das TIC (ao contrário do que acontece com outras áreas). As TIC ainda são encaradas como projectos de excepção, muitas vezes efectuados com recurso a financiamentos conseguidos por candidaturas a programas que, quando acabam, deixam as entidades com custos de manutenção e operação consideráveis, para os quais não têm capacidade financeira.

Por fim, é de referir que a utilização de soluções de código aberto (open source) é, ainda, bastante rara, ao contrário do que se passa em administrações públicas de outros países Europeus bem mais ricos do que Portugal, como é o caso da França. Os custos de licenciamento de software proprietário representam uma boa parte do investimento em TIC feito na Administração Pública. Se nos lembrarmos que, na esmagadora maioria dos casos, um agente da Administração Pública tem apenas que utilizar programas de ‘office’, um ‘browser’ e um cliente de correio electrónico, facilmente se conclui que uma vasta maioria dos equipamentos poderia recorrer a software ‘open source’ sem qualquer problema e com enormes poupanças.


Fernando P. L. Boavida Fernandes
Professor Catedrático da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra
Presidente do Conselho de Administração da Associação Coimbra Região Digital

O Potencial das TIC na Administração Pública

Artigo de opinião publicado no diário ‘As Beiras’
em 18 de Setembro de 2009


As modernas tecnologias de rede vieram permitir acesso a dados, a informação, a serviços e a recursos computacionais a qualquer hora, a partir de qualquer ponto, fixo ou móvel, utilizando débitos binários bastante elevados – normalmente referidos como ‘banda larga’.

Hoje em dia, as tecnologias de rede permitem:
  • agregar o poder de processamento de centenas ou milhares de máquinas numa única máquina virtual;
  • fazer uma utilização totalmente distribuída de um conjunto concentrado de servidores e serviços, tornando a sua localização irrelevante e/ou invisível para os utilizadores;
  • suportar, de forma eficaz, a comunicação máquina-máquina, pessoa-máquina e pessoa-pessoa.

A par do desenvolvimento de tecnologias de rede, o aparecimento de sistemas computacionais cada vez mais poderosos, o desenvolvimento de aplicações de processamento, armazenamento e disponibilização de dados e informação e, ainda, o desenvolvimento de sistemas de informação de larga escala mudaram completamente o modo de funcionamento das organizações.

Naturalmente que a Administração Pública, como entidade fortemente centrada em actividades que envolvem a recolha, processamento e disponibilização de grandes volumes de informação, bem como no fornecimento de serviços à generalidade dos cidadãos, beneficiou de todas as tecnologias já referidas. São vários os exemplos de boa utilização das tecnologias da informação e comunicação (TIC) na Administração Pública e todos os cidadãos reconhecem que, através delas, a interacção Estado-Cidadão tem vindo a ser fortemente melhorada em termos de eficácia.

Para a Administração Pública, o potencial das TIC está, no entanto, longe de estar esgotado. São inúmeras as áreas a explorar, quer ao nível do funcionamento interno, quer ao nível do relacionamento com o cidadão. Enumeram-se, de seguida, algumas:
  • eficiente partilha e exploração de recursos, sejam eles computacionais sejam eles pessoas fortemente especializadas (por exemplo, especialistas de administração de sistemas e redes, especialistas de sistemas de informação), rentabilizando meios materiais e humanos;
  • acesso distribuído a sistemas de informação globais, eliminando-se, desta forma, múltiplos carregamentos de dados e incoerências de informação; o acesso distribuído permite, ainda, que agentes com os mesmos privilégios de acesso tenham sempre a mesma visão sobre os dados e informação, independentemente da sua localização;
  • tele-trabalho – o recurso a redes de alto débito viabiliza a utilização remota de sistemas computacionais a partir de qualquer lugar e a qualquer hora, flexibilizando os horários de trabalho e maximizando a produtividade;
  • tele-reuniões e tele-presença – as tecnologias da informação e comunicação permitem, ainda, a utilização de sistemas de tele e vídeo-conferência, o que conduz a fortes poupanças de tempo e dinheiro, já que são minimizadas as deslocações, conduzindo, ainda, a uma maior interacção entre agentes geograficamente distantes;
  • soluções de back-up remoto e de disaster recovery – o recurso a redes com elevada largura de banda e a distribuição de data centers permitem explorar a redundância de sistemas e a distribuição geográfica para a constituição de soluções de salvaguarda de dados (back-up) e soluções sobrevivência e recuperação de catástrofes (disaster recovery), tornando os sistemas mais robustos;
  • constituição de interfaces entre entidades e os seus públicos alvo, possibilitando, desta forma, a disponibilização de informação e de serviços on-line aos cidadãos em áreas tão importantes como a justiça, as finanças, a educação, a saúde, o lazer, a cultura, a ecologia, a sustentabilidade, o turismo, a segurança, o emprego, a interacção com agentes locais, entre muitas outras.

As TIC têm, indubitavelmente, um elevado potencial para a Administração Pública. Resta agora saber e poder tirar partido dele.


Fernando P. L. Boavida Fernandes
Professor Catedrático da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra
Presidente do Conselho de Administração da Associação Coimbra Região Digital

A Cidade e as Serras Digitais

Artigo de opinião publicado no diário ‘As Beiras’
em 5 de Setembro de 2009


É relativamente frequente ouvir ou ler aqui e ali notícias sobre grandes infra-estruturas de comunicação de dados a instalar em cidades e regiões do nosso Pais. Muitas vezes, a notícia é a quantidade de quilómetros de fibra óptica a instalar ou, ainda, as grandes velocidades e volume de dados que essas verdadeiras ‘auto-estradas’ permitirão. Naturalmente, o leitor menos ligado a estas complicadas questões tecnológicas fica um pouco ‘embriagado’ com tanta Civilização, bem à maneira de Jacinto e de José Fernandes de “A Cidade e as Serras”, do nosso inigualável Eça de Queiroz.

Também muitas vezes – tantas quantas as vezes com que me deparo com essas notícias – me pergunto qual o nível de utilização dessas formidáveis e caras infra-estruturas de TIC (tecnologias de informação e comunicação), onde estão os enormes volumes de dados e conteúdos que as justificam e, por fim, se caberá às regiões digitais o ónus de as concretizar. No fundo a pergunta que faço é se, em termos digitais, queremos a ‘cidade’ pela ‘cidade’ ou se não seria preferível melhorar as ‘serras’ de forma sustentada e harmoniosa.

Naturalmente que a Associação Coimbra Região Digital (ACRD) tem ambições, planos e projectos na área das infra-estruturas de rede. No entanto, o bem português ‘salto no escuro com medo de ficar para trás’ não deve ser desculpa para que não se faça o que deve ser feito: analisar requisitos reais e concretos, tomar decisões sustentadas e planear acções.

Em matéria de infra-estruturas de rede, as regiões digitais deverão funcionar como aconselhadoras e promotoras de soluções, replicando casos de sucesso, validando opções e nivelando desigualdades tecnológicas entre sub-regiões, promovendo, assim, um desenvolvimento solidário. Quais são, então os projectos de infra-estruturas de TIC que fazem sentido e que, portanto, devem ser considerados? Em tão pouco espaço é difícil falar de todos. Destacam-se, no entanto, os seguintes:

• Infra-estruturas de comunicações municipais –sub-projectos no âmbito de cada município, tendo em vista a interligação de edifícios e instalações municipais, nomeadamente de edifícios camarários, juntas de freguesia e, eventualmente, escolas. O objectivo deve ser o de dotar os municípios com meios eficazes de comunicação interna, sempre que ainda não existam, contribuindo de forma eficaz para a melhoria da conectividade interna e do funcionamento dos serviços, e dando resposta a necessidades prementes, já hoje sentidas.

• Infra-estruturas de salvaguarda de dados (back-up e disaster recovery) – Reforço de infra-estruturas regionais de processamento e armazenamento, de forma a que estas possam operar como infra-estruturas de salvaguarda remota de dados dos sistemas municipais existentes. Os benefícios para os municípios são claros, pois podem reduzir custos em termos de soluções de back-up e maximizam a segurança dos dados, através de diversidade geográfica.

• Pontos de acesso sem fios – Aumento do número de pontos de acesso sem fios nos diversos municípios, estendendo a rede já existente. Este aumento traduz-se em benefícios imediatos para a população e visitantes.

• Espaços Internet autárquicos – Reforço dos meios informáticos e do número de espaços para acesso à Internet disponibilizados pelas autarquias. Poder-se-ão estender a juntas de freguesia e a diversos edifícios municipais.

• Projectos de apoio à Internet nas escolas – Apoio às autarquias, no sentido de projectar/disponibilizar/reforçar meios de acesso à Internet nas escolas, complementarmente a outros programas já existentes. Estes projectos terão em vista uma racionalização de meios e redução de custos para as autarquias, estudando as soluções caso-a-caso.

Trata-se de um pequeno leque de projectos que se caracteriza, no entanto, pela exequibilidade e utilidade. Naturalmente que, em termos de infra-estruturas, se poderia ir muito além, mas não deixa de ser verdade que estes ‘pequenos passos’ poderão contribuir de forma decisiva para uma mais verdadeira região digital de Coimbra e evitar “amarguradas ilusões e falsas delícias”.



Fernando P. L. Boavida Fernandes
Professor Catedrático da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra
Presidente do Conselho de Administração da Associação Coimbra Região Digital

Os 10 Mandamentos das Regiões Digitais

Artigo de opinião publicado no diário ‘As Beiras’
24 de Julho de 2009, página 30

Apesar de constituídas há vários anos, as regiões digitais são, ainda, no essencial, desconhecidas para o cidadão comum. O que são? Para que servem? Qual o seu impacto? Falemos hoje de linhas de orientação estratégica para as regiões digitais. Naturalmente, as que aqui se referem serão aquelas que, em primeiro lugar, dirigem a acção da Associação Coimbra Região Digital (http://www.coimbradigital.pt/), embora, no entender do autor, devam ser aplicáveis a qualquer região digital. Ao dá-las a conhecer ao leitor pretende-se, também, envolvê-lo na estratégia da ACRD, convidando-o desta forma a contribuir para os seus objectivos. Porque são dez e porque são gerais, chamar-lhes-emos os 10 mandamentos das regiões digitais.

1º- Utilidade - A actividade das regiões digitais deve ser orientada para a execução de projectos que conduzam a um claro benefício, impacto positivo e utilidade para os cidadãos. As regiões digitais não existem para se manterem a si próprias, mas sim para servir o cidadão, contribuindo para a melhoria da sua qualidade de vida.

2º- Visibilidade –As regiões digitais devem utilizar as TIC (Tecnologias da Informação e Comunicação) como forma privilegiada para dar acesso a serviços e visibilidade à região, aos seus concelhos, às actividades que aí são desenvolvidas e às pessoas que nela vivem.

3º- Suporte – Deverão as regiões digitais apoiar os municípios e comunidades que delas fazem parte em projectos de natureza inter-municipal e/ou regional e, ainda, em projectos de natureza municipal e/ou local para os quais sejam por aqueles solicitadas. Tanto quanto possível, deverão as regiões digitais funcionar como aconselhadoras e promotoras de soluções, replicando casos de sucesso, validando opções e nivelando desigualdades tecnológicas entre sub-regiões, promovendo, assim, o desenvolvimento solidário.

4º- Projectos – As regiões digitais devem promover projectos de desenvolvimento aplicado e inovação em três grandes áreas: infra-estruturas tecnológicas, serviços/aplicações e conteúdos. A primeira destas áreas é indispensável ao suporte das outras duas. Os serviços/aplicações devem potenciar a interacção entre cidadãos, entidades locais e regiões digitais, de acordo com o princípio da utilidade. Os conteúdos potenciam a visibilidade da região, das suas comunidades e dos cidadãos.

5º - Práticas –As regiões digitais deverão basear a sua actuação num conjunto de boas práticas de TIC, reconhecidas nos sectores público e privado. Para tal, devem recorrer a soluções de TIC testadas e com provas dadas, ou seja, devem fazer uso de soluções tecnológicas estáveis e com benefício potencial reconhecido. As infra-estruturas deverão ser correctamente dimensionadas, tendo sempre por objectivo o fornecimento de serviços e conteúdos, isto é, a presença da região na Internet, e não serem um objectivo em si mesmo.

6º- Parcerias– Deverão as regiões digitais estabelecer parcerias, protocolos e acordos com entidades do sistema científico e tecnológico nacional (SCTN), privilegiando mas não se cingindo às entidades da respectiva região, no sentido de avaliar, definir e/ou implementar soluções eficazes para os seus problemas e necessidades.

7º- Localidade –Deverão as regiões digitais privilegiar, na medida do possível e sempre que adequado aos fins em vista, o recurso a serviços de empresas e entidades de carácter tecnológico com fortes ligações à região, tirando partido do tecido empresarial local e fomentando o seu desenvolvimento.

8º- Custos - As regiões digitais deverão privilegiar a adopção de soluções de baixo custo e, sempre que possível e adequado, de código aberto (opensource) e/ou a integração de soluções já existentes com aquele tipo de soluções. Deverão ser cuidadosamente ponderados aspectos relacionados com custos de desenvolvimento, de operação, de manutenção e de evolução de soluções aplicacionais.

9º- Financiamento –Devem as regiões digitais participar activamente na submissão de candidaturas a programas nacionais e regionais de financiamento, tendo em vista a execução dos projectos definidos nos respectivos planos de actividades.

10º - Sustentabilidade –As regiões digitais devem procurar garantir a sua sustentabilidade através do apoio dos seus associados, da rentabilização de infra-estruturas, da prestação de serviços e, ainda, da celebração de contratos, projectos e/ou protocolos com entidades e empresas.


Fernando P. L. Boavida Fernandes
Professor Catedrático da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra
Presidente do Conselho de Administração da Associação Coimbra Região Digital

As TIC e as Regiões Digitais

Artigo de opinião publicado no diário ‘As Beiras’
10 de Julho de 2009, página 34

As regiões digitais estão na moda. Nunca se falou tanto em novas tecnologias, em redes de nova geração, em fibras ópticas, em banda larga, em Internet móvel, em planos tecnológicos, em portais, em informatização e em desmaterialização. De repente, parece que os fins deixaram de ser importantes e passaram a importar, apenas, os meios. Se está informatizado é bom, se usa novas tecnologias é vantajoso e se tem fibras ópticas é avançado. Certo? Infelizmente, não é necessariamente assim.

Dir-se-ia que quem escreve estas linhas é contra novas tecnologias ou não as conhece adequadamente, que não é um profissional com vinte e sete anos de experiência em tecnologias da informação e comunicação (TIC), que não tem sob sua responsabilidade grandes e modernas infra-estruturas de TIC, que não está a par do desenvolvimento e investigação que se fazem no pais e no estrangeiro nesta matéria. Felizmente, não é esse o caso. Há, apenas, que desmistificar o papel que tais tecnologias – de inquestionável importância e utilidade – podem desempenhar no desenvolvimento local, regional e nacional. Para tal, nada como tentar responder a duas ou três questões simples, em bom Português, acessível a pessoas de todas as áreas e formação, ou seja, a todos os leitores.

A primeira questão que me vem à ideia é a seguinte: o que é uma região digital? Na sua essência, uma região digital não é mais do que uma aproximação colaborativa e concertada à melhoria do fornecimento de serviços, por parte de várias entidades de uma dada comunidade, recorrendo a um leque de tecnologias da informação e comunicação mais ou menos inovadoras.

A segunda questão – e, talvez, a mais importante – é: para que serve uma região digital? Se a questão é natural e simples, já a resposta exige algum trabalho, a julgar pela dificuldade com que várias das regiões digitais que existem em Portugal se deparam em afirmar-se e dar-se a conhecer aos cidadãos. Em última análise, uma região digital deve servir para melhorar a qualidade de vida dos cidadãos por ela abrangidos, em áreas tão importantes como a educação, a saúde, o lazer, a cultura, a ecologia, a sustentabilidade, o turismo, a segurança, o emprego, a informação, a eficácia e eficiência das interacções com os agentes locais, entre muitos outros aspectos. As questões chave são, claramente, a orientação para o cidadão, a utilidade, a procura, a necessidade e os benefícios, e não as tecnologias, que têm sempre que ser encaradas como um meio – certamente inovador - mas não como o objectivo das regiões digitais. Por exemplo, para os residentes numa comunidade sem serviços de saúde especializados não é relevante a tecnologia utilizada para a realização de consultas, diagnóstico ou prescrição remotos, mas sim que tais actos possam ser realizados. Serão estes melhores se forem prestados com recurso às TIC? Obviamente que a sua qualidade dependerá, essencialmente, do profissional de saúde.

A terceira questão é: mas, afinal, não devem as tecnologias da informação e comunicação ser visíveis para que as regiões digitais tenham sucesso? Claramente, não. O papel das TIC é, naturalmente, central para as regiões digitais, mas aquelas só devem ser visíveis para os especialistas, porque são estes que têm que as implantar no terreno, operar e manter. Felizmente que, para guiar um automóvel não precisamos de o construir, de o saber reparar ou de saber como é feito. O mesmo se passa com as TIC e com quem as utiliza. De facto, pode afirmar-se que as regiões digitais serão um sucesso quando os cidadãos se esquecerem de que elas existem e quando a utilização de todo o vastíssimo leque de serviços e vantagens que elas podem oferecer for tão simples que ninguém mais fale em novas tecnologias, redes de nova geração, fibras ópticas, banda larga, Internet móvel, planos tecnológicos, portais, informatização e desmaterialização. É nesse sentido que a Associação Coimbra Região Digital está a trabalhar.


Fernando P. L. Boavida Fernandes
Professor Catedrático da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra
Presidente do Conselho de Administração da Associação Coimbra Região Digital