domingo, 16 de dezembro de 2012

Uma prenda ideal


Artigo de opinião publicado no diário ‘As Beiras’
em 11 de Dezembro de 2012


Apesar da crise, nesta altura do ano todos procuramos encontrar formas de dar prendas àqueles que são importantes para nós. Todas as prendas têm uma mensagem associada – seja ela de amor, carinho, ou estima – e, mais frequentemente do que se julga, essa mensagem é tanto mais eloquente quanto maior o empenho que quem oferece colocou na sua escolha.

Questões económicas à parte – o que, nos dias de hoje, é bastante difícil para a esmagadora maioria das pessoas, diga-se de passagem – porque não oferecer prendas mais tecnológicas? Num mundo caracterizado por uma crescente dependência das tecnologias da informação e comunicação (TIC), é certo que muitas prendas desse tipo serão excelentes e fortemente apreciadas por quem as recebe.

Não será surpreendente o facto de este tipo de ofertas ser mais do agrado das camadas mais jovens da população, pois é próprio da natureza humana que nessas faixas etárias as pessoas sejam, em regra, mais atreitas às descobertas, aos desafios e a tudo o que represente novidade. Essa é uma característica fundamental para o crescimento, para a superação de obstáculos e, portanto, para a maturação.

Por outro lado, também não é surpreendente que sejam essas as prendas mais rapidamente esquecidas. Um dos fatores que para isso contribui é, naturalmente, a obsolescência desses equipamentos, ditada pelo constante avanço tecnológico e o consequente aparecimento de equipamentos com melhores características e funcionalidade. Mas o fator principal é o de que a promessa de desafio intelectualmente interessante rapidamente se esvai ao fim de algumas utilizações. Em regra, trata-se de equipamentos cujo potencial lúdico ou cultural foi fortemente sobrevalorizado, nos quais a forma se sobrepôs claramente ao conteúdo no ato da escolha.

Quantos desses equipamentos resistem ao primeiro ano? Quantos são guardados, como recordações preciosas de momentos importantes das nossas vidas? Certamente, uma percentagem ínfima. E quantos brinquedos ou presentes menos tecnológicos são conservados ao longo dos anos, décadas e, até, vidas? Incontáveis.

Destes, muitos são livros, de todos os tipos, formas, tamanhos, idiomas e épocas. É que os livros têm um ritmo compatível com a vida, transportam-nos para outros mundos sem sairmos deste, encerram ideias, sentimentos e emoções que perduram no tempo e podem, até, ser intemporais.

E, para além de tudo o resto, os livros têm uma bateria que nunca se gasta, não precisam de atualizações de software, não têm ‘crashes’, arrancam instantaneamente, são imunes a vírus, e as suas páginas estão sempre disponíveis.

Por isso,  agora que procura uma prenda ideal, uma prenda que cause impacto, que seja lembrada, que perdure, porque não um livro? Há-os para todas as idades, gostos e preços. 

quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Exclusão digital


Artigo de opinião publicado no diário ‘As Beiras’
em 4 de Dezembro de 2012


Tal como o analfabetismo priva as pessoas de entenderem muito do mundo em que vivem, a exclusão digital constitui, nos dias de hoje, um sério obstáculo ao acesso à informação, à cultura e ao desenvolvimento de indivíduos e sociedades.

As tecnologias da informação e comunicação (TIC) são indispensáveis para a sociedade atual, suportando todos os ramos de atividade, possibilitando todo o tipo de serviços – dos mais tradicionais aos mais inovadores – e criando condições para o fomento da atividade económica a nível global.

Por estes motivos, muito se tem debatido na última década a chamada infoexclusão, e inúmeras iniciativas têm sido levadas a cabo no sentido de a combater. Familiarizar os cidadãos com as TIC, instruí-los para que possam tirar melhor partido delas, incentivar a sua utilização, é algo de importância estratégica.

Não devemos, no entanto, exagerar. Longe vão os tempos em que tinha que se saber como funcionavam os computadores para utilizá-los. Hoje todos podemos, com alguma prática, tirar partido de um incontável número de ferramentas informáticas e de todo o tipo de dispositivos digitais. De facto, a tendência atual das tecnologias é a de se tornarem cada vez mais intuitivas, cada vez mais “conscientes” dos utilizadores, das suas preferências e dos contextos em que são utilizadas. Na realidade, pode dizer-se que uma tecnologia é tanto melhor quanto menos se nota.

É certo que, por muito amigáveis que venham a ser as TIC, haverá sempre alguma percentagem de infoexcluídos, percentagem essa que dependerá de muitos fatores, um dos quais será o grau de resistência à “infoinclusão”. Algumas pessoas têm fobia à utilização das TIC, outras têm simplesmente receio ou insegurança. Muitos outros motivos podem existir, mas o que é certo é que para certas pessoas a “infoinclusão” seria uma violência e só traria desvantagens. A propósito desses casos devemos lembrar-nos que a inclusão digital não é um objetivo em si e que o objetivo é o bem estar das pessoas.  

Mas o pior lado da infoexclusão é o de dentro. Refiro-me aos que, sendo digitalmente literatos e, até, proficientes, se vão excluindo – quase sem se darem conta – do mundo real e se submergem irremediavelmente numa qualquer realidade virtual.

Esses veem o mundo através das tecnologias, interagem com outros apenas de forma remota, reduzem a vida a uma incessante interação homem-máquina. Esquecem-se de ver as coisas pelos próprios olhos, ignoram os que estão ao seu redor, deixam-se afogar por um devastador tsunami de dados. São essas as verdadeiras e mais dramáticas vítimas da exclusão que, essa sim, é absoluta e totalmente digital.

Talvez não fosse, assim, má ideia preocuparmo-nos mais com esses do que com os poucos que não querem utilizar as TIC. É que muitos deles pertencem às camadas mais jovens e, por isso, deles dependerá o futuro.