terça-feira, 5 de abril de 2011

Boa ou má ideia?


Artigo de opinião publicado no diário ‘As Beiras’
em 4 de Abril de 2011


Só os menos esquecidos de entre os mais velhos se lembrarão dos grandes e desajeitados computadores de há trinta ou quarenta anos atrás e das formas como se podia interagir com essas estranhas máquinas, então reservadas para o uso de cientistas, engenheiros ou técnicos especializados. Uma dessas formas consistia na utilização de cartões perfurados, simpáticas cartolinas de 82 por 187 milímetros, de várias cores, onde se podiam registar até 80 caracteres.

Os cartões perfurados tinham uma utilidade bem definida: servir de suporte a informação. Por um lado, o utilizador poderia, por exemplo, escrever os seus programas paulatinamente, perfurando cada linha de código num único cartão. Dezenas ou centenas de linhas de código, agrupadas num maço de cartões, poderiam então ser lidas por um equipamento apropriado, fazendo com que o programa passasse para a memória do computador e pudesse ser executado.

O que é curioso registar é que, apesar de os cartões perfurados terem sido utilizados em máquinas tão “modernas” como os computadores de 1970 ou 1980, foram inventados em 1725 por dois operários têxteis franceses, Basile Bouchon e Jean-Baptiste Falcon, que os usaram para controlar teares, tendo o conceito sido aperfeiçoado nos cem anos seguintes, muito antes de existência de computadores.

Um outro exemplo de conhecimento aplicado aos computadores muitos anos depois do seu desenvolvimento é o da álgebra de Boole, ilustre matemático do século XIX, álgebra essa que está na base do funcionamento dos processadores e, portanto, é essencial para o Mundo tal como o conhecemos.

Serve isto para dizer que, como em muitas outras áreas da ciência e da tecnologia, também na informática existem muitos casos de ideias que foram importadas de outras áreas o que, não constituindo qualquer demérito, nos mostra que, afinal, uma boa ideia é sempre de considerar, independentemente da sua origem e do facto de ter ou não utilidade prática imediata.

Exemplos mais recentes são o dos próprios computadores, dos quais, quando apareceram, alguém disse que teriam uma utilidade e mercado muito reduzidos, o da Internet, da qual ninguém imaginaria o impacto futuro, o da World Wide Web, que projetou a Internet para a escala global, o das aplicações peer-to-peer, amadas por uns, odiadas por outros e usadas por quase todos e, por fim, o das redes sociais, que fundiram, de uma vez por todas, a Sociedade com a Internet.

É, portanto, difícil saber à partida se uma ideia, uma teoria ou uma tecnologia é boa ou má. Não existem métricas objectivas que possamos aplicar para aferir o potencial de uma ideia. Não existem avaliadores ou júris, por muito doutos que sejam, que o possam antever. O que pode parecer bom pode falhar. O que pode parecer inútil pode vir a ser revolucionário. Acima de tudo, temos que aprender a lição que a História nos dá: ter ideias é importante, mas mais importante ainda é manter o espírito aberto para as acolher e ter visão para as aplicar.

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