terça-feira, 29 de março de 2011

Privacidade e bom senso


Artigo de opinião publicado no diário ‘As Beiras’
em 28 de Março de 2011


NOTA: Se alguma vez se sentiu constrangido por lhe ser solicitada informação de carácter pessoal num inquérito ou questionário, este artigo é para si.

Constantemente nos solicitam dados pessoais, para registo nesta ou naquela base de dados. Nome, morada, telefone, número de bilhete de identidade, número de contribuinte, data de nascimento são dados obrigatórios em qualquer sistema de informação digno desse nome, seja ele de uma simples loja ou empresa que pretende manter informação dos seus clientes, seja um organismo de carácter mais ou menos oficial. Chega-se, por vezes, a solicitar fotocópias dos documentos de identificação e, até, do cartão de cidadão, contrariando a lei. Se fizermos o exercício de tentar identificar que informação nossa está nalguma base de dados – seja ela qual for – e que informação nossa é exclusivamente do nosso conhecimento, ficaremos surpreendidos com o facto de muito pouca informação se enquadrar nesta última categoria.

Ao permitirem a recolha, manutenção e tratamento de grandes volumes de informação, as tecnologias da informação e comunicação (TIC) são um dos factores que está na base desta situação. A informação é o elemento fundamental da nossa sociedade e, por isso, poucas entidades resistem à tentação de maximizar a quantidade de dados que recolhem e mantêm nos seus sistemas. Nessa perspectiva, as TIC, em geral, e as bases de dados, em particular, são a bênção de gestores, decisores, administradores, administrativos e burocratas, pois colocam a informação de todos e de cada um à distância de um clique.

É certo que existem leis que regem a recolha e o processamento da informação, mas o grau de proteção que elas oferecem varia muito de país para país. Basta constatar que nalguns países a lei não permite que haja um documento de identificação nacional e noutros cada cidadão tem um número único e bem determinado, que o identifica numa base de dados.

É claro que se a recolha e tratamento de informação é para fins estatísticos, tendo em vista a caracterização – global e abstrata – de uma população em termos de dimensão, distribuição geográfica, habilitações médias, hábitos, condições de habitação, saúde e emprego, então existe uma justificação razoável. Mas nesse caso, as respostas devem ser anónimas pois, caso contrário, a informação recolhida permite não só caracterizar a população mas, também, obter dados muito concretos – e pessoais – de cada indivíduo dessa população.

Sabemos todos que a sociedade atual não sobreviveria sem bases de dados e sistemas de informação, já que são essenciais em praticamente todas as áreas de atividade e são vitais em várias delas como, por exemplo, nos sistemas de informação clínica. As TIC e os sistemas de informação são potenciadores de melhorias da qualidade de vida. Temos, no entanto, o dever de cidadania de nos opormos a recolhas abusivas de dados e zelarmos para que, nesta matéria, prevaleça a privacidade e bom senso.