quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Austeridade


Artigo de opinião publicado no diário ‘As Beiras’
em 13 de Novembro de 2012


Nos dias de hoje muito se fala na austeridade como solução para a crise que nos assola. A crise, mero sintoma de um problema complexo, é atacada com uma única arma – a austeridade – automática e universalmente aceite, materializada em menor rendimento para os que trabalham e menos serviços de saúde, de educação e de segurança social para todos os cidadãos.

Curiosamente, por outro lado, pouco se fala nos problemas que estão por detrás do sintoma que é a crise, problemas esses que passam, pelo menos parcialmente, por uma boa dose de falta de racionalidade e rigor na utilização de recursos. Se não se gastasse tanto dinheiro mal gasto, talvez não houvesse tanta necessidade de reduzir a mínimos dramáticos as missões fundamentais do Estado, causando, de um momento para o outro, tanta comoção social.

É certo que, em rigor, nem devia ser necessário estar-se em crise para se falar na otimização da utilização dos meios disponibilizados ao Estado, pagos por todos nós, já que quer em tempos de crise quer fora dela deve ser minimizado o esforço financeiro pedido aos contribuintes.

Infelizmente, não é preciso procurar muito para, em qualquer sector, se encontrarem exemplos de gastos desnecessários. A área das tecnologias da informação e comunicação (TIC) não é exceção.

Um exemplo gritante é o da utilização de todo o tipo de pacotes de software requerendo elevados gastos anuais de licenciamento, apesar da existência de soluções equivalentes de utilização livre (o chamado “open source”). Se contabilizarmos os gastos de licenciamento de software na administração central e local, certamente se atingirão valores de vários milhões de euros. Será que somos mais ricos do que países como a França e a Alemanha, que recorrem a software de utilização livre nas suas administrações?

Ainda no domínio das TIC, a proliferação descontrolada de serviços e plataformas informáticos, replicados até à exaustão em cada sector da máquina do Estado, financiada durante largos anos por arrojados programas de modernização, conduz agora a enormes gastos de manutenção, gestão e atualização, quer de hardware quer de software.

Poucos questionaram então a correção e racionalidade desses “investimentos” (e os que o fizeram sempre foram olhados com desconfiança), mas muitos são os que agora falam em austeridade, sem se preocuparem em ir mais fundo na busca de fatores de desperdício.

Se não há dinheiro, corta-se em pessoas e serviços, pois é muito mais fácil do que identificar as verdadeiras causas do problema, a razão dos gastos, as ineficiências. É muito mais cómodo não admitir erros, não encarar os problemas, não procurar soluções, não tomar decisões. É muito mais simples deixar que a austeridade venha resolver – mal, diga-se de passagem – os problemas que a irracionalidade gerou.

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