terça-feira, 15 de novembro de 2011

O ensino adiado





Artigo de opinião publicado no diário ‘As Beiras’
em 14 de Novembro de 2011


Se muitos dos países mais desenvolvidos do mundo são o que são, muito o devem a uma política de ensino ativa, cuidada e coerentemente mantida ao longo de décadas, se não mesmo de séculos. Sempre foi este o nosso calcanhar de Aquiles, já que ao longo da nossa história, com ênfase nos séculos XIX e seguintes, o ensino foi tratado como um parente pobre num país que, já de si, não é rico.

Diziam os antigos que isso dos livros e dos estudos era só para quem nada que tinha que fazer, pois o importante era amanhar a terra, trabalhar nas fábricas. Tarde reconhecemos que o analfabetismo teve custos incalculáveis para o país, condenando-o a um atraso do qual ainda sofremos as consequências.

Surge agora um novo tipo de literacia – o das tecnologias da informação e comunicação (TIC) – essencial para todas as profissões sem exceção e para todas as atividades produtivas. Consistentemente, países e povos preparam os seus jovens para a sociedade da informação de forma planeada, nas escolas básicas, secundárias e superiores. De entre esses jovens sairão não só pessoas com formação adequada para o dia-a-dia, mas também os novos engenheiros, os novos cientistas, os que construirão o futuro desses países e os que exportarão a sua tecnologia e enriquecerão o seu país.

Nós por cá acabamos com o ensino das TIC no ensino básico e secundário porque, pasme-se, todos sabem desde muito cedo usar um computador! Deixa-se, assim, a formação numa área tão essencial para a sociedade ao sabor do autodidatismo, do amadorismo e da superficialidade. Condenamo-nos, desde cedo, a importar tecnologia, saber e competências por falta de as criarmos no país.

Ficamos, pois, com um ensino que poderia ser o de há cinco décadas atrás, reduzido às disciplinas chamadas estruturantes (como se no básico e secundário não o fossem todas!). Mas se todos sabem usar (frequentemente mal, diga-se de passagem) os computadores desde muito cedo, também desde cedo as pessoas são autónomas na sua língua e desde cedo têm as noções básicas de matemática mais do que suficientes para a vida quotidiana da esmagadora maioria da população, e não é por isso que se deixa de lecionar essas disciplinas, cuja importância é reconhecida unanimemente. A razão é, portanto, outra, e tem a ver exclusivamente com o imediatismo das contas e não com a desculpa mais ou menos esfarrapada de que as crianças já nascem a saber informática. Pobres de nós, que comprometemos o amanhã por não sabermos estabelecer as prioridades no dia de hoje!

Parece que, mais uma vez, pelas mesmas razões – a crise constante, a pobreza do país, o aperto financeiro em que nos encontramos, a urgência de desviar meios para outros fins – vamos perder a oportunidade de ensinar e educar as gerações que são o futuro da nação, criando um outro lote de analfabetos, desta vez digitais. Só daqui a vários anos lamentaremos profundamente os custos para o país deste novo episódio de ensino adiado.

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