quarta-feira, 9 de novembro de 2011

A chave primária





Artigo de opinião publicado no diário ‘As Beiras’
em 8 de Novembro de 2011


Todos estamos habituados a ouvir falar em bases de dados. As empresas têm bases de dados de clientes, as escolas têm bases de dados de alunos, as entidades do Estado têm bases de dados de cidadãos nacionais e estrangeiros, e assim por diante. Os dados – e, mais ainda, a informação – são essenciais para o funcionamento de todas as entidades, e todos nós aceitamos como natural que existam todo o tipo de bases de dados. Afinal, por alguma razão dizemos que vivemos na era da informação.

Os registos contidos em qualquer base de dados têm que ter um identificador único – ou seja, algo que os distinga uns dos outros – que, em linguagem técnica, se designa por chave primária. Por exemplo, numa base de dados de cidadãos eleitores a chave primária poderá ser composta pela conjugação da freguesia de recenseamento com o número de eleitor, já que os cidadãos recenseados numa dada freguesia têm, forçosamente, números de eleitor diferentes. Por outro lado, o nome das pessoas não pode funcionar como chave primária, pois pessoas diferentes poderão ter nomes iguais.

Como vimos no exemplo acima, uma chave primária não é, necessariamente, um número, podendo ser uma conjugação de vários campos, textuais e numéricos. Em bases de dados relativas a pessoas – principalmente se forem bases de dados estatais – a utilização de um número como chave primária, isto é, a utilização de um número para representar pessoas, tende a ser evitada oficialmente por ser considerado politicamente incorreto reduzir pessoas a simples números em bases de dados.

É, talvez, por isso que diferentes países adoptam diferentes políticas no que diz respeito à identificação dos seus nacionais. Em certos países a emissão de um cartão nacional de identificação por cidadão (que contém, necessariamente, um número distinto) é obrigatória. Noutros países, essa emissão é facultativa, Noutros, ainda, não existe qualquer cartão nacional de identificação. Curiosamente, ou talvez não, nestas duas últimas categorias encontram-se alguns dos países mais ricos e mais desenvolvidos do mundo.

No caso de Portugal, numa tentativa de evitar a atribuição de um número único a cada cidadão, existem vários números de identificação – cada qual único – diluindo-se e disfarçando-se assim o “odioso” de cada cidadão ser representado por um número. Destes referem-se o número de identificação civil (ou número de bilhete de identidade), o número de segurança social, o número de utente de saúde e, ainda, o número de contribuinte, todos e cada um deles uma chave primária na correta acepção do termo.

Na prática, no entanto, é o número de contribuinte o que mais força tem, pois é obrigatório desde o nascimento até muito depois da morte. É esta a verdadeira chave primária da grande base de dados a que, por vezes, se quer reduzir o país, que nos parece querer dizer que sendo nós pessoas com direitos civis, sociais e de saúde, para o Estado somos, acima de tudo, contribuintes.

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