quarta-feira, 6 de julho de 2011

O oráculo


Artigo de opinião publicado no diário ‘As Beiras’
em 4 de Julho de 2011


Atualmente, todas as áreas de atividade são tão dependentes das tecnologias da informação e comunicação (TIC) que quase só pelos livros – também estes cada vez mais electrónicos – nos lembramos de como era o mundo antes dos computadores e da Internet. Órgãos de soberania, governos e políticas recorrem intensivamente às TIC. Comércio e indústria – cada vez mais globalizados – servem-se do enorme potencial de comunicação da Internet para alargar mercados. Ensino, investigação, arte e lazer exploram as TIC de múltiplas e variadas maneiras.

Os computadores pessoais e dispositivos móveis são, predominantemente, portas para o manancial de informação acessível através da Internet. De facto, em linguagem corrente muitas vezes se confunde os serviços e repositórios de informação a que a Internet dá acesso com a própria Internet. A pergunta “onde descobriste isso?” é, nos dias de hoje, praticamente supérflua, pois a resposta é, quase invariavelmente, “na Internet”.

A Internet assume-se, assim, como enciclopédia universal, fonte de inesgotável sabedoria, quase com estatuto de mente superior, omnisciente e omnipresente, divindade pagã que todos idolatram. Para muitos – cujo número não pára de aumentar – se está na Internet é verdade, principalmente se estiver nalgum dos seus reputados e incontornáveis sites. Qualquer pessoa que se preze, qualquer iniciativa respeitável, tem que ter existência na Internet. Todo o “bom aluno”, com pretensão a uma boa nota, copia da Internet, quantas vezes não se dando sequer ao trabalho de ler – quanto mais perceber – o resultado do seu mecânico “copy/paste”.

E como a resposta para tudo está à distância de um clique, como tudo o que é relevante e conta está na Internet, como já não é preciso ir para chegar, como tudo se pode fazer remotamente, deixa de ser preciso estudar ou pensar, deixa de ser preciso questionar, perceber o porquê, procurar as causas, avaliar os efeitos, compreender a dinâmica das pessoas, das coisas e do mundo.

Esquecemo-nos de – ou desconhecemos – que a informação que está na Internet foi lá colocada por pessoas reais, que se enganam como todos nós, que não sabem tudo, que têm opiniões que podem ser questionadas. Não nos lembramos que os incontáveis serviços on-line podem estar tão mal concebidos ou organizados como os serviços presenciais.

Como ferramenta inicial para pesquisa a Internet tem grande utilidade. Há que, depois da recolha dos abundantes dados que lá se encontram, digerir e filtrar o que se obteve, consultar outras fontes, estudar e compreender. Mais do que em qualquer outro lugar, na Internet “nem tudo o que luz é ouro”.

De acordo com a mitologia grega, o oráculo de Delfos, construído no templo dedicado ao deus Apolo, no século VII antes de Cristo, tudo sabia e a tudo respondia. Só mitologicamente tal é possível. Não nos esqueçamos, por isso, que, por muito endeusada que seja, a Internet não é o oráculo dos nossos dias.

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